Há já um ano e meio (cerca de 548 dias, mais coisa, menos coisa) que não tenho férias.
Neste ponto da narrativa, não só se admitem, como se encorajam as seguintes expressão de pena e solidariedade:Dito isto, perdoar-me-ão se nem sempre executo as tarefas diárias com o melhor humor possível. Pressinto mesmo, aliás, que me estou a tornar impossível de aturar.
(o chamado "feitiozinho", cuja falta de especificação - feitio bom? mau? - e diminutivo são aqui utililizados de modo depreciativo. Que culpa tenho se tenho um nariz greco-aristocrático, cujo comprimento faz com que se aproxime muito mais rapidamente a mostarda do dito apêndice que o resto dos comuns mortais?!)
Para essa mística intuição contribuiram certas subtilezas no ambiente do escritório, como sejam a insistente demanda da marcação das minhas férias por parte dos patrõezitos,
Chefe Touro Sentado e Chefe Raposa Calada -
uma demanda que neste momento atingiu a frequência diária, excepto durante uma sexta-feira mensal, coincidente com o pico do SPM
(Síndrome Pré-Menstrual, para o pessoal que não foi abençoado com ovários)
em que perguntam várias vezes num só dia. Em meses em que falhei mais que 2 tomas de
pílulahá 7 anos a tomar o comprimidito amarelo e não há mês que passe que não me olvide desse gesto socialmente aceite ao fim de tanta luta por parte de gerações inteiras de mulheres antes de mim - mau-grado o alarme do telemóvel gemer às 21h todos os dias e cerca de 6 pessoas do meu círculo familiar e social mais próximo assumirem ocasionalmenteo o lugar de lembretes humanos. Soubessem essas intrépidas activistas que eram cabecitas aéreas como a minha que se iam agarrar a essas pequenas bombas hormonais e queria ver se tinham gasto o seu latim na causa. O tanas!
o grau de insistência aumenta vários dias antes da sexta-feira negra. Como já expliquei por diversas vezes aos chefinhos, não tiro férias para ficar atolada cá na cidade, portanto sem dinheiro
sem guito, carcanhol, cacau, o vil metal,
daqui não saio. Porque entre trabalhar e fermentar uma neura no bairro cravejado de velhotas simpáticas onde vivo, a escolha é óbvia.
Foi assim com algum agrado que reparei na aproximação de um fim-de-semana prolongado, um fenómeno natural que agracia o comum proletário de quando em quando e que, no calendário português, consegue ser induzido de modo artificial por uma manha frequentemente utilizada a que chamamos "ponte" e a que o o próprio governo não tem pudor a aderir, numa reciclagem nostálgica romana do querido "pão e circo".
Com planos de cravar boleia, fiz assim planos de zarpar para o Reino dos Algarves,
minha querida terrinha, pátria amada,
acostar no sofá de uma das manas , a nossa "problem-child", amancebada com um Croupier com vocação de santo (é tudo mulheres difíceis, lá em casa),
cujos pais - quando não a martirizam com comparações danosas com o supra-sumo das namoradas de todo o mundo que era a ex-namorada do filhote e a seguir a essa não há mesmo quem lhe ocupe o lugar no pedestal apesar de o filhote já não andar com a ex (daí o prefixo "ex") mas isso não quer dizer nada de nada- são pescadores e portanto tinha garantido um "stock" invejável de peixinho fresco para desintoxicar e nutrir este débil amontoado de carne, gelatina, ossos e olheiras a que o espelho insiste a atribuir como meu,
matar saudades do sangue do meu sangue, discutir 3 vezes ao dia com o sangue do meu sangue, pôr-me a par das últimas novidades da vila, passear quilómetros absurdos de beleza pela serra e pela praia, comer quilos de torradas de pão alentejano, sair à noite e rever os amigalhaços do liceu, ler saltar, brincar.
Como deliciosa adição a este texto idílico de folheto estava a presença certa da querida amiga Helena. Abandonada, qual depósito de lixo orgânico, pelo marido, que segue em viagem para filmar cenas épicas que preencherão os nossos ecrãs televisivos com reptos de consumo, a miúda decidia espairecer no sul. Levava carro (o tal suporte logístico de borla).
Tudo pronto e os castelitos construídos no ar. Desmoronam com pompa e circunstância quando recebo a improvável notícia que a Helena, afinal, tem que ficar em Lisboa, capital do Império, para tomar conta da cadela dos sogros. Fico cheia de pena, dizemos "fica para a próxima" e conto então com a minha outra boleia. Todavia o moço que me acomodaria no seu lugar de pendura vai para o JAPÃO nesse preciso fim-de-semana. Não para o Coiro da Burra, não para Paredes da Beira, para o Japão. Pronto, se é assim que vai ter que ser...!
Em conluio com a Helena lá projectámos fim-de-semana "de gajas". Levo a mochila e vou a casa dela - sempre mudo de bairro. Daqui para a frente, é o que for. O que nos espera, não se sabe.
Eu só sei que há já um ano e meio (cerca de 548 dias, mais coisa, menos coisa) que não tenho férias. Neste ponto da narrativa, não só se admitem, como se encorajam as seguintes expressão de pena e solidariedade...
1 comment:
Toma lá umas Onomatopeias,Expressões faciais e Expressões corporais mas Lágrimas não, que não é d'homem. Além disso, a única coisa que me faz chorar é uma boa cebola ou gás lacrimogéneo. Como não tenho andado pelas reuniões do G7 vestido de preto e com uma t-shirt do Che, a única coisa que me arrebata umas prolíferas doses de "mar salgado" é uma muito pouco emotiva cebola. Ao menos sei cozinhar.
Se ainda não desfizeste a mochila bem podes aproveitar o convite e aparecer lá para os lados do Cartaxo. A casa de campo vai estar pejada de convivas para comemorar o aniversário deste Baco ribatejano. Iguarias exóticas bem regadas com o melhor que a adega local pode fornecer. Eu sei que tu te pelas por uma boa farra...
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