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[pah, não quero ser possidónia nem nada, mas a casual utilização destas palavritas estrangeiras traz um elemento de sofisticação ao texto, não traz? É logo outra coisa. Outro jogo. Outra liga. Outro nível. "bláblábláblábláPOSTblábláblá. Não soa bem?! Não arquearam as peitaças em suspiro de admiração "esta-tipa-percebe-mesmo-disto-ena-post-soa-mêmo-bem"?! Não disfarcei, com essa singela palavrinha, o facto de ter levado 3 semanas a descobrir como se formatava a porcaria de um parágrafo?! Porque vejam lá que na minha terrinha a gente quando quer um parágrafo carrega na tecla do "enter" e toca a andar, mas aqui, só para ser diferente, só porque é mais bonito, afinal é preciso um códigozito, uma coisinha tão pouco óbvia quanto o Santana Lopes ter parado a Primeiro-Ministro sem alguém me ter consultado primeiro, umas coisitas com parêntesis e <> antes de cada frase. Pronto. Estava apenas a adiar esta descoberta para depois do meu doutoramento em física quântica. Escuso agora de fazer o doutoramento, com o adiantamento desta feliz informação.
terminava a salva de palavras com o anúncio da aproximação de um "programa de gajas".
Certa que essa divulgação deixou pairar na vossa fértil imaginação a projecção de 3 dias dignos de um videoclipe dos Aerosmith, gostaria de desmentir a putativa fantasia e esclarecer os factos.
Não, não fugimos de um colégio interno vestidas com meinhas altas e pouco mais. Não, não furtámos óculos de sol na bomba de gasolina e não, não gratificámos o funcionário da bomba com uma sucessão de fotografias photomaton com tecido mamário à mostra. Não, não cantámos karaoke com fatiotas de "las Vegas showgirl"e insinuações lésbicas pelo meio e não, não atraímos um agricultor apetitoso de corpo perfeito, nú, para um lago artificial (esta última, com muita pena minha).
A coisa foi mais uma mistura de cura de sono com um pico abrupto de actividade adolescentóide Saturday Night. A ver:
Sábado - dia
Depois de nos mimarmos com um pequeno-almoço principesco tomado a horas de almoço, fomos puxadas pela gravidade - ajudada em muito por um peso brutal no estômago - para o sofá. Aí jazeram os nossos corpos, de pijama, a produzir bolor e a chorar 5 programas seguidos da Oprah
pelo menos eu chorei, que por baixo desta capa fria e corrosiva sou muito sensível
entre outros tantos de transformação de visual, mudança de decoração da casa e um precioso documentário sobre baleias e a reprodução de corais.
Cerca de 5 horas depois, com a cabeça a latejar e a tensão arterial de um pardal, decidi abruptamente que estava na hora de activar a circulação - à falta de Prozac, pareceu-me ser a medida mais segura contra a neura bestial que se avizinhava.
O tempo, tipicamente, estava algo entre um encorajamento da mãe-natureza ao internamento voluntário em sanatório e o cenário cinzento de uma história de amor francesa, daquelas que quando acaba mal, acaba pessimamente.
Troco o pijama pela ganga e o kispo, marcho a passadas largas para a liberdade, dobro a esquina e sinto a chuva miúda a impregnar o cabelo. Chuva por chuvinha, é só água e quando regressasse tinha que tomar um duchezito, portanto decido prosseguir. Foi um daqueles momentos cruciais em que entre virar à direita ou à esquerda, decidimos pela direita e cai-nos um piano em cima da cabeça. No caso, não um piano, mas uma bátega torrencial que me colou o cabelo ao cerebelo.
Largo a correr, dou a volta ao quarteirão e entro directa para o duche. Felizmente, dado o mote, as amigas seguiram o exemplo e a atmosfera densa dissipou do abafado-pijama para uma mistura de brise-pinho e nívea.
Daí seguimos para um estimulante passeio com a cadela, que também teve os seus momentos altos. Entre outros, inventei 122 versões possíveis para os 4 primeiros versos da versão do "Jura" do Rui Veloso, trocando apenas as palavras "lua" e "acontecem". Terrivelmente didáctico. Fomos igualmente agraciadas pelo salvamento comovente da bola da amiguita peluda
por bola, entenda-se uma esfera com o seu próprio peso em saliva, baba, relva e lama, que ao cair no rio Tejo, suspeita-se tenha adquirido propriedades radioactivas
por parte de um herói local - um pescador de fim-de-semana.
Saturday Night
Agarramos em duas amigas, resguardamos a nossa identidade com os nossos nomes-código para o que der e vier e seguimos para Almada, a "road-trip" dos pobres. Chegadas ao destino, a Amélia, a Manana, a Urraca, a Núria e eu (a Kinder, Kindi para os amigos, muito obrigada. Um chocolate-uma surpresa-um brinquedo) prontamente gritamos o coro da Canção das Velhas com o SGodinho (a única que sei mais ou menos de cor), engrenamos na música do Zeca Baleiro e juntamo-nos ao resto do pessoal quando chega à hora de exigir o "encore".
Ora, instigadas pela bela Urraca, em cujos instintos a experiência nos tem ensinado a confiar, decidimos pedir uma coisita que jamais alguém me dedicará e que culmina assim "Éu dária tûdu prá não ver você cáláda...". E quando digo decidimos pedir, pretendo informar que gritámos, possessas:
"ÉU... DÁRIA TÛDU PRÁ NÃO VER VOCÊ CÁLÁDA...!"
A pujança foi tal que o Zequinha lá se dignou a ouvir e pergunta, do palco: "Quáu?" E logo nós, cada vez mais animadas:
"ÉU... DÁRIA TÛDU PRÁ NÃO VER VOCÊ CÁLÁDA...!"
O rapazito agita-se de um lado para o outro e vem para o nosso lado, com ares de quem não tá a ouvir. Nós ajudamos:
"ÉU... DÁRIA TÛDU PRÁ NÃO VER VOCÊ CÁLÁDA...!"
As luzes estão em cima de nós, conseguimos parar Almada com o nosso entusiasmo, todos os olhos estão fixos neste ping-pong entre cantor e espectadoras. É aqui que a porca torce o rabo. Com ar de estranheza, o rapaz cospe pró microfone: "´Cês têm á cêrtêza qui éssa é minha?!".
O coração gela, eu coro porque é o que faço sempre,
seja ou não preciso ou adequado, que esta pele marmórea não dá tréguas à dona (maldita falta de melanina!)
a Urracazita parece vacilar, instala-se entre nós o rumor que se calhar a música é do Lenine, assim de repente não temos a certeza e é impossível disfarçar ou transportarmo-nos instantaneamente tipo Star Trek para a Conchichina, agora já toda a gente viu e ouviu, que barraca.
O moço lá retoma o espectáculo com outra coisa qualquer e nós, no final, optamos pela teimosia e vamos ter às boxes por trás do palco, atiramos palpites sobre qual será a do camarim e é a essa que batemos entusiasticamente, do lado de fora das grades e berramos, declaradamente adolescentes,
"ÉU... DÁRIA TÛDU PRÁ NÃO VER VOCÊ CÁLÁDA...!"
Lá de dentro, ouvimos resposta, portanto eu retomo, sem pudor, a bater na madeirita e a replicar
"ÉU... DÁRIA TÛDU PRÁ NÃO VER VOCÊ CÁLÁDA...!"
e quando viro a cara, a estranhar a desistência súbita das amigas, dou de caras com 4 polícias de choque a avançar simpaticamente na nossa direcção. Antecipando que uma mudança brusca de atitude evitaria explicações embaraçosas aos miúdos da igreja que tão diligentemente me esforço por encaminhar e edificar com exemplos de boa conduta e maturidade, desisto da empreitada e sentamo-nos todas, inconformadas, numa paragem de autocarro.
Para apaziguar as facções Lenine-Zeca Baleiro que se levantavam, decido prometer um jantarito grego lá em casa se a Urraca não nos tivesse enganado.
A pesquisa discográfica resultou no seguinte: a música é mesmo do Sr. Baleiro (indecente que se tivesse recusado a tocar um dos seus primeiros trabalhos) e eu, que - é universalmente conhecido - DETESTO COZINHAR, vou mesmo pôr o avental e laborar ao fogão para produzir iguarias que apenas o destino ditará se serão causa de gastroenterites ou não. Fogo.
Zeca, querido, quando leres estas linhas (e é evidente que o farás, porque a tua bagagem cultural estará sempre desfalcadérrima se não o fizeres), pensa bem no mal que provocaste e no quanto
"ÉU... DÁRIA TÛDU ...!"